sexta-feira, 17 de julho de 2020

Filosofia em Tempos de Pandemia - para começar a conversa

Ao iniciarmos o ano letivo de 2020 não poderíamos imaginar os desafios que teríamos que enfrentar. Embora em janeiro de 2020 já se falasse por aqui do novo coronavirus, as mortes naquele momento eram lá na China, e tudo parecia muito distante. Em fevereiro as mortes eram na Itália e, em poucas semanas, os telejornais nos trariam cenas aterradoras de caixões empilhados, caixões carregados em caminhões das forças armadas: eram mais de 1000 mortes por dia. Mas ainda parecia distante de nós.

E foi da Itália que chegou o primeiro caso do novo coronavírus confirmado no Brasil, em 26 de fevereiro. Mas muitos de nós continuávamos achando que estava longe, que o novo vírus não chegaria nas pequenas cidades, ficaria lá, nos grandes centros e logo tudo estaria bem. Mas aos poucos os casos foram aumentando, pipocando aqui e ali, até que tivemos o primeiro óbito confirmado pelo novo coronavírus, em 16 de março. E foi nessa semana que a maioria das instituições de ensino, básico, técnico e superior, anunciaram suspensão de atividades presenciais e empresas dos mais variados setores entraram em home office

O novo cenário que passamos a enfrentar trouxe muita dúvida, muita angústia, muito medo. De repente, muitos de nós nos vimos privados de encontrar nossos familiares, amigos ou colegas de trabalho. Sentimos um baque, como se estivessem roubando algo de nós... muitas pessoas perderam emprego ou perderam condições de trabalhar e, consequentemente, perderam a fonte do seu sustento. Milhares de brasileiros a essa altura do campeonato já perderam mãe, pai, avós, primos e amigos para esse vírus. O que parecia tão distante lá em janeiro ou fevereiro, agora já tem rosto conhecido. Rostos que tinham nome, que tinham histórias, sonhos e que foram interrompidos. 

Lidar com a perda é um dos grandes desafios humanos. Nossa condição de ser finito - mortal - logo nos coloca diante da perda de alguém querido. Se em tempos normais isso já não é fácil, e quando estamos impedidos de nos despedir? Quando nossos rituais são interditados? Quando o luto é vivido de forma solitária? A essa altura é bem possível que todos nós já tenhamos perdido alguém ou conheçamos alguém que perdeu. Dentre as muitas questões que têm sido feitas sobre o pós-pandemia, talvez a mais urgente delas é: quais os impactos das perdas que a pandemia causou - e ainda causará - para cada um de nós, do ponto de vista emocional, individual e coletivo?

Muitas dessas vidas - mais de 84 mil , e esses são os números oficiais, é bem provável que já seja bem mais do que isso devido a subnotificação - poderiam ter sido salvas, não fosse a condução desastrosa dessa que é a maior crise sanitária dos últimos anos. Mas não estamos sozinhos na má condução da pandemia: EUA, Reino Unido são nossas companhias. Em comum esses países têm líderes negacionistas que diminuíram a importância da pandemia, que disseram que não era preciso fazer isolamento, que disseram que era só uma gripezinha, que estavam exagerando, que indicaram medicamentos que não tinham eficácia comprovada e disseram que a economia não podia parar por causa disso. Mas é bom que digamos também que muitas dessas vidas poderiam ter sido salvas se nosso sistema de saúde fosse tratado com a seriedade que precisa, se os investimentos em saúde pública fossem adequados ao tamanho do nosso país. E isso não é de agora!

Mas o que tem a Filosofia com tudo isso?, muitos de vocês podem estar se perguntando. O que a Filosofia tem a dizer sobre a pandemia? sobre nossa insistência em querer acreditar que não chegaria até nós? sobre as perdas? sobre a morte? sobre o negacionismo científico? sobre a saúde pública? Talvez você fique surpreso, mas há muitas coisas que a Filosofia e os filósofos podem dizer - disseram e estão dizendo - sobre tudo isso e muitas outras coisas: sobre fake news, sobre as mídias digitais e sociais em tempos de isolamento social, sobre os medos e angústias que estamos enfrentando.

O meu convite é para que possamos descobrir juntos o que a Filosofia tem a nos dizer sobre tudo isso, mas, acima de tudo, o meu convite é para que possamos juntos pensar, refletir sobre esses tempos estranhos, difíceis e, por que não, sombrios, que estamos vivendo. Porque todos nós certamente estamos cheios de dúvidas e questionamentos sobre tudo isso. E dúvidas e questionamentos são ótimos pontos de partida para a Filosofia!

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