O livro Política de Aristóteles traz uma passagem muito famosa na qual o filósofo afirma que o "homem é por natureza um animal político." Segundo Aristóteles, a evidência de que o homem seria um animal político, mais do que as abelhas e os outros animais gregários (que vivem juntos) é o fato de só o homem possuir a palavra [logos /linguagem].
"Como dizemos frequentemente, a natureza não faz nada em vão; ora, o homem é o único entre os animais a ter linguagem (logos). O simples som é uma indicação do prazer ou da dor, estando portanto em outros animais, pois a natureza destes consiste em sentir o prazer e a dor e em expressá-los. Mas a linguagem tem como objetivo a manifestação do vantajoso e do desvantajoso, e portanto do justo e do injusto. Trata-se de uma característica do homem ser ele o único que tem o senso do bom e do mau, do justo e do injusto, bem como de outras noções deste tipo. É a associação dos que têm em comum essas noções que constitui a família e o Estado." ARISTÓTELES, Política.
Segundo Aristóteles, faria parte da nossa própria natureza nos juntarmos a outros iguais a nós para compartilhar as dores e alegrias da vida. Primeiro nos reuniríamos em famílias; várias famílias reunidas formam uma aldeia; várias aldeias crescendo num mesmo espaço formam uma pólis. A pólis seria assim não uma "invenção" humana, mas a realização da própria natureza dos seres humanos.
No entanto, como observa Silvio Gallo, "ainda que uma cidade se origine de uma reunião natural de famílias, não podemos ver essas comunidades humanas como uma simples continuidade." Pois Aristóteles afirmava a existência de duas esferas, a privada - relativa à família e à casa de cada um - e a pública - relativa à comunidade política, à cidade. Sendo assim, enquanto a economia (oicos - casa + nomos -leis, regras) é a ciência da gestão casa, a política ( politika - as coisas relativas à pólis) é ciência da gestão da cidade.
Aristóteles identifica diferente tipos de poder próprios de cada uma das esferas acima identificadas. "na esfera privada, doméstica, um pai de família exerce quatro tipos de poder: um poder econômico, que é a faculdade de organizar e gerir sua própria casa; um poder paternal sobre os filhos; um poder marital sobre a mulher; e um poder despótico sobre quem é por ele escravizado." (GALLO, 2017). Já na esfera pública, no contexto da democracia ateniense, a política era uma atividade que acontecia entre iguais (aqueles que eram considerados cidadãos: homens livres, filhos de pais atenienses, em dia com o serviço militar).
De acordo com Gallo, "ainda que seja resultado de um processo natural, a comunidade política tem uma finalidade principal: o "bem viver juntos". E o bem viver, para Aristóteles, consiste na felicidade - "felicidade privada", que diz respeito à vida de cada um, e "felicidade pública", que está relacionada com a vida pública na sociedade." Uma cidade feliz é aquela na qual os cidadão têm a possibilidade de se dedicar à atividades que garantem aquelas felicidades, a saber, a contemplação e a dedicação ao pensamento (felicidade privada) e participação na política (felicidade pública).
Assim como seu mestre Platão, Aristóteles não tinha simpatia pela democracia. No entanto, Aristóteles também não se convenceu de que a sofocracia de seu mestre fosse a melhor opção. Depois de identificar as seis formas de governo recorrentes, a partir dos critérios de número e de valor: Monarquia, Aristocracia, Politia (formas boas de governo) / Tirania, Oligarquia e Democracia (formas corrompidas de governo), Aristóteles aposta num governo misto como sendo a melhor forma de garantir estabilidade à cidade. Uma mistura entre democracia e oligarquia - na qual nem os ricos (oligarquia) nem os pobres (democracia) estariam no poder, mas uma classe intermediária.
A influência de Aristóteles no pensamento político ocidental é muito grande. As seis formas de governo por ele tipificadas foi referência para boa parte dos filósofos que vieram depois dele.
Material consultado: GALLO, Silvio, Filosofia: experiência do pensamento, São Paulo: Scipione, 2017.